Por Iliane Maria Coura

A pandemia causada pelo novo coronavírus, chamado COVID-19, vem acarretando não somente o flagelo na saúde mundial, mas também promovendo ações e decisões de toda ordem ao redor do planeta e em todas as escalas de poder governamental, como vem sendo noticiado ao longo das últimas semanas. No Brasil não tem sido diferente. A cada dia novas medidas são anunciadas. Tudo para conter o avanço da doença que, segundo previsões técnicas, deve atingir uma larga parcela da população.

Nesse cenário de incertezas, inseguranças e temores, as medidas restritivas vêm sendo implementadas por todos aqueles que estão no comando das instituições governamentais e privadas responsáveis pela gestão e administração no âmbito de suas atribuições legais. Dentro desse universo de coletividades, estão os condomínios edilícios. Administrados por síndicos devidamente eleitos pelos condôminos, o síndico assume a responsabilidade de gerir a coisa alheia em prol de todos, coproprietários das áreas comuns e proprietários das chamadas unidades autônomas (casas, apartamentos, sobrados e outros assemelhados). Assim, o síndico torna-se a figura central da administração do condomínio, pois a ele é delegado o poder de administração.

Nesse contexto, a tomada de decisões faz parte da atividade do gestor que em casos de urgência não lhe permite, muitas vezes, a convocação prévia de assembleia geral para o debate e deliberação dos condôminos. É o momento que a coletividade condominial está vivenciando.

E o que fazer diante deste cenário?

Diante de um cenário de caos e temor pela disseminação de uma doença para a qual a medicina ainda não tem um tratamento eficiente, tão pouco vacina para a proteção da sociedade, muitas decisões têm sido tomadas como medidas de proteção. Com a proteção caminham as medidas restritivas de uso de áreas comuns com acessos, halls, escadas, elevadores, garagens, salão de festas, playground, academias, quadras esportivas, piscinas, churrasqueiras, etc. O cuidado de se impor medidas restritivas nas áreas comuns é a consequente supressão, ainda que parcial, do direito de fruição inerente ao direito de propriedade como descrito no Artigo do Código Civil, que expressamente prevê “O proprietário tem a faculdade de usar, gozar e dispor da coisa, e o direito de reavê-la do poder de quem quer que injustamente a possua ou detenha.”

Cuidado!

Tomando em conta o grande número de condomínios em nosso país, oportuno destacar o poder de decisão do síndico para que, em nome de uma urgência causada pela pandemia do COVID-19, não extrapole os limites das suas atribuições, tão pouco tome decisões unilaterais sem a chancela de um conselho consultivo ou da assembleia geral. Porque tais dissonâncias podem causar para além de transtornos à coletividade, responsabilidades civil e criminal por abuso de poder e violação das prerrogativas fundamentais constitucionais dos direitos individuais e de propriedade.

Síndico:

1. Função – é a figura central da administração condominial. Representa o condomínio ativa e passivamente, em juízo ou fora dele, é eleito por assembleia para um lapso temporal estipulado na convenção do condomínio a fim de desempenhar as funções a ele atribuídas por lei e pelo instrumento convencional. A figura do síndico assume o papel de administrador, de executor das decisões deliberadas pelos condôminos em assembleia. Esta função tem natureza executiva.

As suas atribuições estão previstas no Artigo 1348, do Código Civil, além de outras complementares estipuladas na convenção do condomínio.

2. Dever legal de administrar coisa alheia – os deveres do síndico decorrem da lei e da convenção. Por isso, consideram-se as atribuições do síndico elencadas no Artigo 1.348, do Código Civil como “poder- dever”. De igual forma, pode fazê-lo a convenção condominial na medida em que esta pode atribuir ao síndico atribuições específicas complementares à lei. Incluem-se nas atribuições dentre tantas, o dever de agir (convocar assembleia); o de realizar (implementar as deliberações dos condôminos, contratar o seguro da edificação, dentre outros); o de fazer (prestar contas, efetuar o rateio e cobrar as cotas condominiais, dentre outros), o de se fiscalizar (execução de contratos com terceiros com obras, reparos, serviços, etc.) dentre outros deveres.

3. Obrigação de zelar, cuidar, diligenciar, realizar, sempre no interesse comum dos condôminos.

Poder decisório do síndico: limitado

O poder de decisão do Síndico está adstrito às suas atribuições, portanto é limitado. O síndico enquanto executor das deliberações de assembleias se limita a dar efetividade às decisões tomadas pelos condôminos. Logo, não pode por conta própria alterar o que foi decidido em Assembleia. Entretanto, dentro da margem de liberdade de ação que possui o síndico, pode, de acordo com o estabelecido em convenção, agir, sem se descuidar do interesse comum dos condôminos. Observe-se o que diz o Código Civil, nesse sentido: “Art. 1348, V- diligenciar a conservação e a guarda das partes comuns e zelar pela prestação dos serviços que interessem aos possuidores.”

Logo, é prudente que as decisões tomadas em tempos da pandemia (COVID-19) sejam previamente debatidas com os conselheiros. E tal prudência é recomendável principalmente para os casos de inexistir na convenção aludida previsão de situação como esta que a sociedade está vivendo. Isso porque o síndico deve cumprir a convenção e o regimento interno e na ausência de normas expressas, cabe a ele convocar assembleia para deliberar sobre o assunto, valendo a decisão tomada pela maioria dos condôminos presentes na reunião ou pelo voto qualificado como determina a convenção ou no seu silencio a regra da lei.

Então, como tomar decisão de forma prudente sem cometer excessos ou infração aos deveres de administração?

Primeiro, sugere-se que para condomínios pequenos com poucas unidades apresenta-se viável a convocação de assembleia para tratar sobre as medidas restritivas de usos das áreas comuns. Lembrando que em casos de urgência, como o de agora, o prazo convencional fica dispensado ante o motivo de força maior. Nesse caso, cabe ao síndico tomar todos os cuidados para arrumar o espaço físico da reunião seguindo as orientações dadas pelo Ministério da Saúde, como distanciamento das cadeiras, sala arejada, álcool gel para higienização das mãos, etc.

Já para os condomínios de médio e grande porte, afigura-se relevante se valer da convocação do Conselho Consultivo, quando este existir na estrutura condominial, ou na sua ausência o Conselho Fiscal, para juntos com os Conselheiros tomarem as medidas de restrições urgentes orientadas sempre pelo bom senso e com base nas orientações técnicas emitidas pelo Ministério da Saúde.

Colher a opinião dos condôminos é outra medida que pode orientar o síndico e conselheiros a tomarem as medidas necessárias para a prevenção e proteção de todos em face da pandemia. Para isso, pode se usar o grupo de whatsapp; e-mails; assembleias virtuais e outros recursos de tecnologia disponibilizados na comunidade condominial e de acesso aos condôminos. Em alguns casos, condomínios menos favorecidos de tecnologia, o síndico e conselheiros com a colaboração de alguns condôminos podem ir até as unidades para colher a opinião dos moradores sobre as medidas restritivas que devem ser adotadas ou se já adotadas, a concordância dos moradores ou sugestões para adequação das medidas tomadas e graduação das restrições segundo o avanço ou não da doença em sua localidade.

Responsabilidade da gestão

O que se apresenta fundamental e deve sempre nortear as decisões do síndico nesse momento de pandemia é a proteção da coletividade condominial. Porém, as ações devem ser orientadas com a responsabilidade da gestão, a observância dos aspectos jurídicos para não ferir direitos e garantias individuais como o de ir e vir, e, principalmente, não cometer excessos desnecessários que possam violar o direito de propriedade.

Por fim, vale lembrar que a assembleia geral dos condôminos é o órgão máximo de deliberação na estrutura condominial e a ela devem ser levados todos os assuntos relevantes que afetam os condôminos. Logo, a ratificação de eventuais decisões tomadas em caráter de urgência deve passar pela assembleia geral dos condôminos tão logo possível, salvo se de uma forma ou de outra os condôminos participaram das decisões tomadas para a restrição do uso das áreas comuns do condomínio.

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